A termoelétrica é na periferia, mas o cheiro de enxofre sai da Praça dos Três Poderes -Destruição de uma Escola do Campo para instalação de Termoelétrica em Samambaia
- Ian Coêlho
- 6 de abr.
- 3 min de leitura
Destruir uma Escola do Campo, com cerca de 500 alunos, para instalar uma usina termelétrica é um ato simbólico que expõe como funciona o Estado brasileiro desde sua fundação: a serviço de interesses privados e em detrimento da classe trabalhadora e de suas condições básicas de vida. A Escola do Campo Guariroba, localizada na região de Samambaia, já foi removida uma vez para dar lugar a um aterro sanitário. Agora, novamente ameaçada pela construção da Usina Termelétrica (UTE) Brasília, ela representa não apenas uma instituição educacional, mas também a esperança, as crianças, os jovens e as comunidades vulneráveis que têm suas vidas subordinadas aos interesses econômicos do capital desde 1500.
Enquanto lutamos por tarifa zero e por um transporte público de qualidade, rápido e eficiente — porque defendemos o direito de ir e vir em sua materialidade, e porque sabemos que essa é também a melhor solução para reduzir a poluição nas cidades —, os assentamentos rurais têm feito um trabalho incansável de restauração dos biomas, literalmente plantando água, ao recuperar a mata ao redor das bacias hidrográficas, como ocorre na Bacia do Descoberto, aqui em Brasília. Enquanto lutamos para salvar o Rio Melchior — e dar nome aos bois que poluem nossas águas, cobrar, punir e restaurar —, estamos também comprometidos com a energia solar descentralizada, como instrumento de geração de renda para quem precisa e de promoção de uma verdadeira transição energética justa. Mas os interesses do governo federal, em conluio com o governador Ibaneis, implementam projetos que socializam os prejuízos, nos sufocando na fumaça tóxica, e privatizam os lucros.
Querem que a fumaça que sentimos no ano passado, resultado das queimadas criminosas dos nossos biomas, seja o novo normal. Nada melhor para isso do que uma máquina de emitir fumaça, 24 horas por dia, 7 dias por semana. Essa usina termelétrica, movida a gás fóssil, não será apenas uma ameaça à saúde pública, mas também aumentará em 50% a emissão de gases de efeito estufa no Distrito Federal, agravando a crise climática num cenário em que Brasília caminha para a inabitabilidade.
Uma pequena termoelétrica equivalerá à metade das emissões anuais de todos os habitantes, setores, indústrias e comércios do Distrito Federal — sem gerar nem uma centena de empregos locais, dada a alta mecanização e especialização exigida para a operação da planta. É a expropriação dos nossos rios, biomas e saúde para enriquecer os sócios das empresas que financiam os políticos do status quo.
Carlos Seabra Suarez, um dos sócios das duas empresas interessadas no projeto — Termonorte (UTE Brasília) e TGBC (Gasoduto Brasil Central) —, foi o 15º maior doador nas eleições municipais de 2024. Nos últimos cinco anos, o empresário já desembolsou mais de dois milhões de reais para financiar candidaturas em todos os níveis da federação.
Essa situação está profundamente enraizada nas relações políticas e econômicas corruptas que permeiam o Brasil. A lei de privatização da Eletrobrás, sancionada em 2021, acrescentou a obrigatoriedade de que estados que não possuíam geração por termoelétricas passassem a tê-las até 2026. Outros “jabutis” que queriam inserir nessa lei — de incentivos ilegítimos e injustificáveis às termelétricas — foram transferidos para o projeto de lei sobre eólicas offshore, outro exemplo de greenwashing. Esses mesmos agentes são os que defendem a exploração de petróleo na Foz do Amazonas, colocando ainda mais em risco ecossistemas intocados e comunidades tradicionais.
O governo “líder climático” segue firme na falácia de que ainda é possível explorar combustíveis fósseis — e pior, o faz vendendo o nosso presente e futuro aos interesses privados internacionais, aliando-se a quem for necessário pelo caminho, como o expoente do bolsonarismo na capital, o governador Ibaneis Rocha.
O governo capitulou. A tal “melancia” — verde por fora, vermelha por dentro — apodreceu, e deu lugar ao marrom do petróleo, ao rubro do sangue indígena, ao âmbar da seiva das árvores, extraídos, expropriados e explorados em nome do lucro de poucos.
É urgente que estejamos organizados: nas ruas, nos movimentos populares, nas associações de bairros e comunidades, lutando contra esses retrocessos e construindo o poder popular — que é a única saída. É preciso ser capaz de imaginar e fazer um mundo diferente!
Commentaires